Istambul

Com sabão, com afeto


O banho hammam está longe de ser uma unanimidade entre quem visita a Turquia. A idéia do banho coletivo, o constrangimento de ser esfregado publicamente, as dúvidas em relação à limpeza do local e a incógnita sobre a etiqueta do ritual: tudo isso afasta o turista da experiência, o que é uma grande pena. Para começar, é melhor escolher um lugar recomendado pelos guias: vai estar cheio de turistas como eu e você, mas é melhor para entender o espírito do negócio – depois fica mais fácil se aventurar pelos hammans freqüentados pelos locais. Duas boas opções e bem localizadas (em Sultanahmet) são o Cağaloğlu e o Çemberlitaş – este último foi o que escolhi. 
Pesou na escolha o fato dele ter sido construído no século XVI pelo grande arquiteto Sinan e ser famoso pela beleza das instalações. Pelo visual externo não dá para ter uma idéia, assim que se chega ao portãzinho escondido no meio de lojas, em plena esquina da Divan Yolu, mas o espaço é grande e ao mesmo tempo aconchegante, a começar pela salinha da recepção. É ali que se escolhe o tratamento e se paga: pode ser só o acesso ao hammam para sauna e banho, o serviço de banho ou este mais uma massagem. Fiquei só com o do meio, que era o ritual que me interessava.

Com uma fichinha indicando o serviço desejado e uma luva esfoliadora descartável nas mãos, fui conduzida ao lado feminino: para começar, uma área de descanso espaçosa, com sofás típicos, fonte e trocadores no mezanino. A escolha de ficar como veio ao mundo ou de calcinha é da freqüentadora, enrolando-se depois no pano que te oferecem, o pestemal. Um par de crocs e o modelito está perfeito para o banho. Uma porta pesada de madeira separa a salinha de descanso das senhoras que te lavarão da sala quente.

Esta é a principal área do hammam, composta de uma plataforma quente octogonal, com fontes de água quente e fria ao redor, lindamente decoradas, algumas dentro de salinhas mais privadas. O primeiro passo é achar um espaço entre outras turistas nessa plataforma central, estender a sua canga, digo, pestemal, e se deixar suar e relaxar…coisa que acontece muito rapidamente, posso garantir. A sensação de estar participando de um ritual histórico é empolgante e ajuda muito a beleza da sala, a sua cúpula vazada com vidro, deixando passar a luz de fim de tarde…Uma atmosfera muito própria para relaxar, meditar, se divertir.

Depois de um bom tempo na moleza, surgem as ‘lavadoras’, só de calcinha: elas entram e se posicionam em cada lado da plataforma e vão indicando com um gesto firme – ‘Você: aqui!’. Ao ver o porte delas, ninguém questiona, mas já pensa na esfoliação, ui! Você estica o seu pano na beirada e começa o processo com a luvinha que você entregou a ela: é uma esfregação vigorosa, mas no meu caso esteve longe de ser desagradável, não precisei dar um toque para relaxar a pressão. Aliás, é um alívio ver toda aquela pele morta indo embora. Depois de uns baldes de água, eu estava pronta para a segunda parte: um banho com muita espuma e uma leve massagem…É engraçada a sensação de alguém estar ali te esfregando, algo tão comum que nem damos a devida atenção ao banho no dia-a-dia. Aconselho a aproveitar.
Depois disso mais um enxágüe e ela te encaminha para uma das fontes. Sentada sobre o seu pano, ela vai lavar o seu cabelo e enxaguá-lo. Voilà! Está quase pronto o banho, agora é a sua vez de se recolher às salinhas com mais privacidade e lavar as partes íntimas.

Limpa e esfoliada, a dúvida agora é ir embora ou voltar para a plataforma e relaxar mais um pouco, bater papo com a mulherada, tomar mais um banho faça-você-mesmo e voltar a suar…É muito interessante o clima coletivo e íntimo ao mesmo tempo, uma coisa meio ‘fraternidade feminina’, apesar da clara divisão locais trabalhadoras – turistas branquelas relaxando. Não sei qual é o clima da ala masculina, mas as salas são parecidas, assim como os tratamentos – a única diferença é que os homens são convidados a manter o pestemal enrolado na cintura.
Caso você queria se aventurar pelo mundo dos hammans, sugiro que vá logo no primeiro dia: você pode até não gostar, mas se isso acontecer…vai querer ir todos os dias!
(Todas as fotos pertencem ao site do Çemberlitaş Hammam)

30 Comments

  1. Arnaldo - Fatos & Fotos de Viagens

    EMÍLIA, eu tive a oportunidade de visitar dois hammans em Damasco e eles se parecem muito com os das fotos desse de Istambul, tanto na arquitetura quanto na ornamentação.
    Lá o funcionamento é semelhante. mas os mais interessantes parecem ser os de Marrakech, onde além dos tratamentos, especialmente na área feminina, o lugar serve como uma área de convívio social, já que as mulheres não têm lá assim tantos lugares onde reunirem-se publicamente. Elas alémd e tratarem-se, relaxam e falam de suas famílias, maridos, filhos, problemas.
    Eu não usei, apenas visitei, mas li que em Damasco é como em Istambul: você pode auto-esfoliar-se e optar por um profisisonal para fazê-lo. em Marrakech é comum que um homem que esteja ao lado se ofereça para esfoliar suas costas, e vc deverá retribuir fazendo o mesmo, caso aceite ser auxiliado.
    A experiência em Marrakech foi mais pelo luxo do hammam do la Mamounia do que pelo tratamento em si, que é igualzinho ao dos hammans públicos, todavia mais privativo, menos coletivo.
    Dessas experiências a que mais me agradou foi a dos banhos onsen, em águas quentes termais do Japão.
    Um fato incontestável e importante é que devemos deixar todo o preconceito de lado e sabermos que tanto para os homens quanto para as mulheres, uma experiência num hamman é altamente recomendável e agradável, antropologicamente falando, saudável e confortável, que em nada há além de profissionalismo e atitides sérias daqueles que lá trabalham esfregando a gente.
    Bela experiência a sua.

    • Emília

      A essência da experiência e os tratamentos são realmente parecidos, tanto no hamman turco quanto no marroquino. As diferenças estão: no lugar (uma construção histórica e um luxuoso hamman moderno no La Mamounia), na diferença dos produtos usados (no Çemberlitas era um sabão líquido bem comunzão, rss…) e na sutileza das moças que aplicavam o tratamento 😀
      Cada uma inesquecível a seu estilo…fiquei fã dos hammans!
      E gostaria muito de experimentar o onsen, tenho certeza de que ficaria fã deles também 😉

  2. docesparagens

    Adorei as fotos e o texto.Impressionante este ritual e gostaria imenso de passar pela experiência.

  3. Felipe Alves

    Ola Emilia, com certeza ir a um pais mulsuman e nao provar suas tradiçoes, nao tem muito sentido….tive oportundiade de ir em Chefchaouen e era super normal, como turista prefiro ir aos grandes e conhecidos mesmo, ao final se vamos viver a experiencia somente uma vez, temos que provar do melhor que podamos, nao?
    um abraço,
    Felipe

  4. Felipe Alves

    Ola Emilia, com certeza ir a um pais mulsuman e nao provar suas tradiçoes, nao tem muito sentido….tive oportundiade de ir em Chefchaouen e era super normal, como turista prefiro ir aos grandes e conhecidos mesmo, ao final se vamos viver a experiencia somente uma vez, temos que provar do melhor que podamos, nao?
    um abraço,
    Felipe

  5. Emília

    A você que está em Portugal, docesparagens, talvez seja mais fácil experimentar um hamman marroquino, que também é delicioso 😀
    Felipe, concordo plenamente: como é bom ter um gostinho das tradições locais! E se divertir fazendo isso 😀 Por isso preferi um lugar onde eu pudesse me sentir mais à vontade para cometer algumas gafes, se fosse o caso, hehe…Também quis me sentir segura e escolhi um dos dois melhores: vale mesmo a pena investir no melhor para se ter uma experiência marcante, afinal não sabemos quando ou se iremos voltar, não é mesmo?
    Ah, e Chefchaouen deve ser uma beleza, vi fotos maravilhosas da cidade e depoimentos de que é encantadora. Um dos próximos temas aqui no blog será Marrakech!
    Um abraço!

  6. Emília

    A você que está em Portugal, docesparagens, talvez seja mais fácil experimentar um hamman marroquino, que também é delicioso 😀
    Felipe, concordo plenamente: como é bom ter um gostinho das tradições locais! E se divertir fazendo isso 😀 Por isso preferi um lugar onde eu pudesse me sentir mais à vontade para cometer algumas gafes, se fosse o caso, hehe…Também quis me sentir segura e escolhi um dos dois melhores: vale mesmo a pena investir no melhor para se ter uma experiência marcante, afinal não sabemos quando ou se iremos voltar, não é mesmo?
    Ah, e Chefchaouen deve ser uma beleza, vi fotos maravilhosas da cidade e depoimentos de que é encantadora. Um dos próximos temas aqui no blog será Marrakech!
    Um abraço!

  7. Isabel O., Portugal

    Olá Emília
    Faço parte do grupo que ainda não experimentou…
    Da sua experiência houve algo que ficou por passar – e os aromas dos produtos?… Muito fortes? Enjoativos?
    Acho que associo estes odores a um perfume absolutamente deprimente que se cheirava em Portugal, quando eu era pequena, e se chamava “Madeiras do Oriente”. Ficou um preconceito sensorial remanescente.
    Conte lá, então…

  8. Emília

    Bom te ver por aqui, Isabel!
    Posso te recomendar sem problemas o hammam então porque os produtos usados não lembram em nada esses aromas duvidosos…Sabe o que usam? Um prosaico sabonete Nivea liquido comum e um shampoo equivalente, hehe…Sem glamour, mas também nada de agressão ao nariz 😉
    Um beijo!

  9. Emília

    Bom te ver por aqui, Isabel!
    Posso te recomendar sem problemas o hammam então porque os produtos usados não lembram em nada esses aromas duvidosos…Sabe o que usam? Um prosaico sabonete Nivea liquido comum e um shampoo equivalente, hehe…Sem glamour, mas também nada de agressão ao nariz 😉
    Um beijo!

  10. Eduardo Luz

    U-a-u!
    Muito bom o post e com um texto tão elucidativo que poderíamos ignorar as fotos ( se bem que elas estão muito boas!).
    Também estou no grupo dos que não foram (ainda), mas também estou no dos que certamente irão.
    Turquia, aqui vamos nós!!

  11. Eduardo Luz

    U-a-u!
    Muito bom o post e com um texto tão elucidativo que poderíamos ignorar as fotos ( se bem que elas estão muito boas!).
    Também estou no grupo dos que não foram (ainda), mas também estou no dos que certamente irão.
    Turquia, aqui vamos nós!!

  12. Emília

    Edu, eu sou suspeita porque eu gostei muito da experiência e acabo recomendando para todo mundo que vai à cidade! Mas acho que vale muito a pena, não só pelo relaxamento, mas pelo lado antropológico da coisa 😀
    Só um alerta: apesar de ser famoso e muito recomendado como um dos melhores de Istambul, o Çemberlitas não é luxuoso, longe disso (acredito que seja o mesmo com o Cagaloglu). É tudo muito bonito e típico, mas mais para o lado espartano (veja o meu comentário sobre os produtos usados logo acima, para a Isabel). Tendo isso em mente, é muito divertido!
    Quando vocês forem eu quero o seu depoimento para acrescentar aqui, já que não tenho feedback do lado masculino. Espero que seja logo! 😉

  13. Mari Campos

    Emilia, tambem acho que uma viagem a Turquia nao eh completa sem a experiencia de um hammam autentico. Eu tambem acho inesquecivel minha experiencia no Cemberlitas – nao ha luxo, nao foi mesmo minha melhor experiencia tipo spa, mas eh tudo tao autentico e peculiar (do clima entre as mulheres e dos acessorios de higiene simplerrimos `a “delicadeza” das lavadoras)que, por isso mesmo, eh inesquecivel. Ate hoje lembro desse teto “estrelado” do Cemberlitas – passei muito tempo relaxando na pedra quente olhando pra ele 😉

  14. Mari Campos

    Emilia, tambem acho que uma viagem a Turquia nao eh completa sem a experiencia de um hammam autentico. Eu tambem acho inesquecivel minha experiencia no Cemberlitas – nao ha luxo, nao foi mesmo minha melhor experiencia tipo spa, mas eh tudo tao autentico e peculiar (do clima entre as mulheres e dos acessorios de higiene simplerrimos `a “delicadeza” das lavadoras)que, por isso mesmo, eh inesquecivel. Ate hoje lembro desse teto “estrelado” do Cemberlitas – passei muito tempo relaxando na pedra quente olhando pra ele 😉

  15. Emilia

    Mari, o bacana ‘e isso mesmo: um lugar simples e bonito, muito pr’oprio ao relaxamento e diversao 🙂 O interessante ‘e que encontrei dois grupos de brasileiras, olha so…e um deles na volta do hammam, elas estavam cheias de duvidas e curiosissimas, hehe…
    Um beijo!

  16. Emilia

    Mari, o bacana ‘e isso mesmo: um lugar simples e bonito, muito pr’oprio ao relaxamento e diversao 🙂 O interessante ‘e que encontrei dois grupos de brasileiras, olha so…e um deles na volta do hammam, elas estavam cheias de duvidas e curiosissimas, hehe…
    Um beijo!

  17. Cristina

    As fotos são incríveis!

  18. chopp

    òtimo post, e ótimas fotos. Parabéns!!!

  19. chopp

    òtimo post, e ótimas fotos. Parabéns!!!

  20. viagemafora

    Emilia,
    Tivemos apenas uma experiencia com o Hammam na Turquia e não foi legal, devido a varios fatores que não nos agradou, mas acredito que devemos repetir a experiencia.
    As suas imagens dão vontade de voltar agora para refazer a nossa experiencia.
    bjs

  21. Emília

    Obrigada aos dois! Adorei as fotos, pena que não são minhas, rss…Só senti não ter fotos da parte feminina, mas realmente não teria como :mrgreen:

  22. Emília

    Obrigada aos dois! Adorei as fotos, pena que não são minhas, rss…Só senti não ter fotos da parte feminina, mas realmente não teria como :mrgreen:

  23. Paula*

    Emília, estou me “atualizando” do seu blog e adorei esse post!
    A Turquia com certeza está no topo da minha lista e não vou deixar de jeito nenhum de experimentar o hammam. Acho que deve ser uma experiência tão antropológica quanto relaxante! Adorei a dica! 😉

  24. Emília

    Paula, com certeza é uma experiência que vale. Eu voltaria com certeza! E feliz de te rever no sábado! 😀

  25. Emília

    Meninos do Viagemafora, o comentário de você estava preso!
    Uma pena que a experiência do hammam não foi boa, mas fiquei curiosa para saber o que aconteceu? Onde vocês fizeram, em Istambul ou no interior? Era um mais usado por locais ou turistas? Se puderem, contem aqui para nós.
    Um abraço!

  26. CNA Salary

    Great information! I’ve been looking for something like this for a while now. Thanks!

  27. Inês

    Emília estou devorando suas postagens de Istambul. Quanto tempo leva todo esse processo do banho?
    Eu, como você, também acrescentei Istambul num outro roteiro e estou encantada com tanto a ver e curtir, mesmo tendo já passado um dia de passeio no roteiro do navio sei que a cidade tem muita a acrescentar…estou adorando

  28. Emília

    Oi, Inês!
    Istambul é mesmo cidade para uma semana inteira, até um mês inteiro! Mas o banho leva em torno de 1h e meia, 2 horas. É o suficiente para relaxar bem antes do banho, fazer a esfoliação e relaxar um pouco mais…
    Um abraço!

  29. Sirinevler

    Hamam’ın mimarı Hamdi Turunç‘tur.
    Hamam’ın yapılış tarihi 1965’tir. Şirinevler’de M.Fevzi Çakmak Caddesi 3.sokak’ta yer alır. Hamam’ın arka sokagında M.Akif Camii vardır. 50 Senelik bir tarihe sahiptir. Şirinevlerde yaşı 50’nin üzerinde olan herkes tarafından bilinen bir yerdir.
    Şirinevler Hamamı yapıldığı yıllarda kadınlar hamamı ve erkekler hamamı olmak üzere çifte hamam olarak yapılmıştır. Daha sonraki yıllarda kadınlar hamamı iptal edilerek erkekler kısmı ile birleştirilip Sadece haftanın bir günü Çarşamba günleri kadınlar hamamı olarak çalışmaya devam etmiştir.
    Hamam tek kubbelidir.

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